sábado, 21 de dezembro de 2013

Crazy for you


Ao som de muito sapateado e, claro, de músicas tocadas por uma orquestra, que não pode faltar num musical, o espetáculo Crazy for you é uma adaptação da Broadway que estreou em Nova York no ano de 1992. Este foi um grande marco na história dos musicais por exaltar a genialidade artística norte-americana tão famosa por suas coreografias sincronizadas, num ritmo obedecido com extrema perfeição, acompanhado do brilho contagiante dos atores e de cenas típicas presentes nos filmes americanos que fizeram história, por exemplo, com o astro da dança Fred Astaire.

            Com adaptação de Miguel Falabella para a versão brasileira que acontece no teatro do Complexo Ohtake Cultural, Crazy for You destaca um tortuoso e complicado romance que surge entre Bobby Child (Jarbas Homem de Mello) – um playboy nova-iorquino cujo sonho é se tornar um astro dos musicais, porém seu desejo é totalmente repreendido por sua mãe, que espera que o filho se interesse pelos negócios da família – e Polly (Cláudia Raia), uma rude interiorana que vive na pacata e quase deserta cidade de Pedra Morta.

            Em um determinado dia, Bobby é enviado por sua mãe para Pedra Morta com o objetivo de cobrar uma dívida do dono de um teatro local que está falido e precisará ser fechado. No entanto, ao chegar lá Bobby acaba se apaixonando por Polly, a filha do proprietário do teatro, e resolve então “ressuscitar” o estabelecimento artístico montando um espetáculo juntamente com o povo da região e algumas bailarinas de um famoso diretor artístico que reside em Nova York. Elas vão até a cidade pacata exclusivamente para ajudar Bob. Mas uma série de confusões e conflitos acaba dificultando a aproximação de Bob de sua amada, que com seu gênio embrutecido não demonstra, a princípio, o menor afeto por ele.

            A história simples e praticamente linear do espetáculo é totalmente preenchida por fabulosas apresentações artísticas bem longas, cujas músicas ganham um prolongamento apenas instrumental ao seu final para estender o tempo das coreografias do elenco, que neste momento aproveita para dar um show no palco. Apesar do sincronismo nem sempre ser seguido com extrema perfeição, a dança tão desenvolta e corporal, cujas variações arrancam aplausos e ovações da plateia em vários momentos, se enriquece sonoramente com os barulhos rítmicos produzidos pela brincadeira sonora feita pelos atores com os próprios objetos de cena.

            Sem contar ainda o espetáculo de sapateado que envolve Jarbas e Cláudia Raia e complementa a peça no decorrer de sua história, fazendo alusão a uma das cenas mais memoráveis para o gênero musical, envolvendo a dança de sapateado entre Fred Astaire e Ginger Rogers no filme Vamos Dançar, cuja música, “They Can’t Take Away From Me”, também pode ser ouvida neste musical na voz de Cláudia Raia. Crazy for you é um delírio principalmente para os ouvidos dos amantes de musicais, por trazer composições fantásticas de George Gershwin e letras de Ira Gershwin, que se destacaram na Broadway.

            Vale ressaltar o papel de Jarbas Homem de Mello, cuja desenvoltura e extrema agilidade cênica exigidas para o seu cômico papel arrancam altas risadas dos espectadores, e ainda vale destacar um diferencial trabalhado neste espetáculo pelo diretor José Possi Neto, que confere identidade para cada um dos figurantes que compõe o elenco. Algo inclusive que deveria ser mais aplicado nos demais espetáculos musicais, os quais, por exigirem um numeroso elenco, acabam ofuscando o papel de muitos atores que se restringem apenas a ser figurantes. Porém, em Crazy for you, cada personagem tem uma personalidade diferente e não passa despercebido pela plateia, já que cada um tem o seu momento, sem sair das imposições de seu papel.

Com 150 minutos de duração, é perceptível que o musical segue à risca a versão original em todos os momentos, com cenografia e figurino muito bem trabalhados e também pelo estilo da coreografia que obedece a original criada por Susan Stroman.  

O musical encerra a temporada deste ano no dia 22 de dezembro e volta em cartaz no dia 9 de janeiro de 2014 no Complexo Ohtake Cultural. 

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Grupo Tapa comemora 30 anos e oferece Festival “Última Chance” com grandes apresentações teatrais


Peça Berro 

O Grupo Tapa, um dos mais conceituados grupos de teatro brasileiro, comemora 30 anos de existência em 2013 e quem sai ganhando é o público, que poderá acompanhar diversas obras cênicas escritas por grandes dramaturgos, com destaque para Tennessee Williams – pseudônimo de Thomas Lanier Willians, estadunidense que ganhou diversos prêmios, incluindo o Pulitzer – encenada pelo elenco. É o Festival “Última Chance”, que teve início no dia 2 de novembro e se estenderá até o dia 21 de dezembro no Teatro de Arena Eugênio Kusnet. 

O Festival é a última oportunidade de conferir ainda neste ano algumas novidades cênicas e outras interpretações já conhecidas que foram apresentadas pelo Grupo e são trazidas novamente aos palcos.
Até o dia 21 de dezembro, o Grupo trará diferentes apresentações que ocorrerão sempre aos sábados às 18h. Entre os espetáculos que já passaram pelo Teatro de Arena destaca-se Alguns Blues do Tennessee, composta por três histórias curtas de Tenessee Willians: O Quarto Escuro, Verão no Lago e A Dama da Noção Antipiolho. Todas refletindo medos e tragédias humanas dotadas de realismo tanto pelo estilo do autor, quanto pela atuação vívida do elenco, que cria uma tensão gradativa na plateia à medida que os dramas se intensificam dentro de cada personagem e suas respectivas histórias.

O Festival trará ainda as peças As Desgraças de uma Criança, de Martins Pena, que narra a história de dois garotos que acabam gerando grandes confusões para encobrir seus romances proibidos com duas garotas; Senhorita Júlia, de August Strindberg, que aborda um embate entre uma aristocrata e seu criado; Berro, de Tennessee Willians, que conta os desafios a serem enfrentados por dois irmãos atores, que são abandonados pelos integrantes de sua companhia teatral e, ao encenarem sozinhos uma peça sobre dois irmãos, são totalmente repudiados pela plateia, e As Viúvas, de Arthur de Azevedo, que traz três comédias (Amor por Anexins, Uma Consulta e O Oráculo) sobre os planos de três viúvas para conquistar um marido.

Criado no Rio de Janeiro em 1979, o Grupo Tapa tornou-se cada vez mais conhecido não só entre o público mais restrito de teatro como entre a população em geral e, conforme crescia imensamente nos palcos através de suas encenações dramáticas, foi ganhando um respeito cada vez maior da crítica, que passou a aclamá-lo frequentemente.

O Grupo destacou-se principalmente por seu estilo único e identificável de fazer teatro, optando sempre por imergir no mundo das obras de grandes dramaturgos nacionais e internacionais, cujas histórias possuem uma densidade extrema e cativante ao mesmo tempo. O enriquecimento intelectual e a complexidade emotiva, social e histórica presentes em cada obra destes renomados escritores, tão cativantes e transformadores no mundo cultural, tornam-se um desafio para todo aquele que decide personificá-los no palco, justamente por se tratar de um material tão influenciador e que necessita de tamanha competência para sua teatralização.

E o Grupo Tapa, nestes 30 anos de existência, conseguiu e vem conseguindo dar vida nos palcos a todas as histórias destes escritores, por meio de uma atuação envolvente de toda sua competente equipe e também do excelente trabalho do seu diretor artístico Eduardo Tolentino de Araújo. Trata-se de um trabalho muito mais ligado à atuação do que à cenografia, já que o Grupo é conhecido por suas apresentações em cenários simples, onde o complemento maior está nos atores, os quais, desprovidos de qualquer elemento externo, já se mostram capazes transmitir toda a genialidade das obras, baseando-se para isto apenas neles mesmos.

Vale a pena conferir o Festival e entender o teatro em sua essência e originalidade, com análises profundas e reflexivas sobre a sociedade em que vivemos.

Programação:
Senhorita Júlia
Dia 30/11 às 18h

Berro
Dias 7/12 às 18h e 8/12 às 19h

As desgraças de uma criança
Dia 14/12 às 18h

As viúvas de Artur de Azevedo

Dia 21/12 às 18h

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

domingo, 10 de novembro de 2013

Il Volo


Já pensou em assistir a um espetáculo onde é possível ouvir simultaneamente todo o classicismo presente na ópera, o modernismo da música pop e a sutileza do canto romântico? Pois saiba que essa mesclagem já é possível e vem fazendo sucesso por todo o mundo, atraindo públicos de diferentes gostos musicais que se unem em prol de uma musicalidade única e contagiante para os ouvidos de todas as faixas etárias. Como é o caso do trabalho produzido pelo trio Il Volo, grupo formado por três jovens tenores italianos: Gianluca Ginbole Castorani (18), Piero Barone Ognibene (20) e Ignazio Boschetto (21). 

Esses três rapazes despertaram seu potencial para a música ainda na infância e decolaram de vez nesta carreira após participarem de uma competição musical da TV Italiana RAI, em 2009. Desde então vêm se tornando conhecidos por onde passam e conquistando inúmeros fãs pelo planeta. Depois de já se apresentarem no Brasil em 2012, eles voltam para cá no palco do Teatro Bradesco, em São Paulo, para o lançamento do álbum We Are Love – o primeiro CD Il Volo foi lançado em 2010 e chegou a ocupar a 10a posição na Bilboard 200 e a primeira no ranking de álbuns clássicos.

Mesmo quem não for um apreciador de primeira instância de música clássica certamente se encantará com a performance vocal destes três jovens, cujos timbres arrepiam até as paredes do teatro. Afinal, Il Volo não se destaca por cantar ópera em seu sentido mais tradicional, e sim por fazer justamente o oposto ao trazer um classicismo dotado de um modernismo oriundo do conceito de ópera pop.

Entre as canções que se destacam no repertório do espetáculo estão aquelas endeusadas pelos apreciadores da boa música, como Memory, Smile, Granada, Il Mondo e um esplêndido encerramento que levou a plateia a cantar em coro a aclamada Sole Mio. Considerado um tenor spinto – que alcança o tenor lírico com facilidade, ou seja, um timbre encantador semelhante ao do violoncelo – Piero Barone é quem mais se destaca do trio.


Trata-se de um concerto destinado a cativar públicos de todas as idades justamente por quebrar o conceito mais classicista da ópera e modernizá-lo, para assim convidar um público mais jovem a imergir neste encantador mundo da música clássica. Il Volo fará mais três apresentações nos dias 11, 12 e 13 de novembro no Teatro Bradesco. Imperdível.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Três Dias de Chuva


Quem já não se frustrou ou se irritou com uma situação aparentemente desapontadora e, após investigá-la a fundo, descobre revelações surpreendentes, indicando que nada é o que parece ser? Esta intriga é um dos cernes da peça Três Dias de Chuva, que narra a história de dois irmãos que se reencontram para a partilha de bens deixada por seus falecidos pais e vão junto com seu amigo de infância Pip – o filho do falecido sócio do pai deles – para a leitura do testamento, a qual lhes reserva grandes surpresas.

Dividido em dois atos, o espetáculo mostra em seu primeiro momento, no ano de 1995, a atriz Carolina Ferraz* interpretando a personagem Anna, que reencontra seu irmão Walker (Otávio Martins), após este sumir por um ano logo que seu pai morreu. Passado algum tempo de peça, surge Pip (Petrônio Gontijo), que terá altas discussões com Walker depois dos mistérios revelados na leitura do testamento. Já no segundo ato, que se passa em 1960, Carolina, Martins e Gontijo aparecem no palco encarando os pais de Walker, Anna e Pip e grandes segredos escondidos por eles surpreenderão a plateia.

Escrito por Richard Greenberg, um dos grandes dramaturgos norte-americanos, e com direção de Jô Soares, o espetáculo é composto por um roteiro rico de diálogos afiados e que trabalham a mente do público convidando-o a fazer uma análise reflexiva sobre o choque de gerações. A encenação de duas épocas distintas, e que ao mesmo tempo se mostram entrelaçadas pela ligação entre os personagens do espetáculo, proporciona uma excelente conexão dos espectadores com a trama, já que eles precisarão estar o tempo todo atentos a tudo que se passa, principalmente no segundo ato, para fazerem as devidas associações entre os papeis cênicos e descobrirem o que realmente está por trás dos pais de Walker, Anna e Pip que revelam, inclusive, terem vivido um triângulo amoroso.

Por focar nesta passagem de tempo, mostrando as diferenças comportamentais e sociais em cada época representada no palco, a peça tem como principal atributo a transformação dos atores em cena de forma desafiadora, já que eles precisam denotar claramente essa mudança, não somente através do comportamento, como também de uma linguagem tão rica quanto a empregada por Greenberg. Neste quesito, o ator Otávio Martins é quem mais se destaca, cumprindo perfeitamente sua função ao incorporar, no primeiro ato, um Walker ainda extremamente perturbado, não somente com a morte do pai, mas também com o complicado relacionamento tido com ele quando vivo. Já no segundo ato, ele encara um papel extremamente oposto ao seu primeiro, por interpretar o pai introvertido e gago de Walker.

 Em relação aos demais atores, essa transformação se mostra perceptível de modo bem menos atenuante, chegando a ser quase linear no caso de Gontijo, algo que foge um pouco da obra de Greenberg, que propõe uma exteriorização das diferenças de geração.

Além disso, o linguajar cênico do elenco poderia identificar melhor as diferenças de época, mas acaba mantendo grandes similaridades entre os dois atos. Todavia, no geral, a genialidade do roteiro continua a se fazer presente no palco e não deixa de prender a atenção do público devido a sua excelente história.

*A partir de 11 de Outubro, a atriz Carolina Ferraz passou a ser substituída pela Adriane Galisteu.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Elysium


O ano é 2154. O planeta Terra está fadado à tragédia total, constituindo um lugar sem esperança, cercado de doenças e sujeira por todos os lados, sendo habitado apenas pela população mais pobre que sobrevive à base de migalhas e, à procura desesperada por sustento, muitos acabam entrando para o mundo da criminalidade.

Enquanto a maioria morre vítima da fome e de doenças num planeta de condições precárias, outros desfrutam de uma vida luxuosa, cercada de todo o conforto possível e ainda usufruindo de uma tecnologia super avançada para se curar de todas as doenças como num passe de mágica.  Esse paraíso é Elysium, uma estação espacial habitada pelos ricos que abandonaram a Terra para viverem longe de sua precariedade e dos pobres que nela habitam.

Este é o cenário do filme Elysium, que estreou em primeiro lugar nos EUA faturando R$ 72 milhões apenas no primeiro fim de semana. No Brasil a produção chegou aos telões em 21 de setembro de 2013. Com concepções extremamente futuristas, a trama mostra um universo cercado de máquinas – incluindo robôs parecidos com humanos – capazes de curar as mais agravantes doenças, como o câncer, num piscar de olhos, através apenas do simples apertar de um botão.

Enquanto os habitantes de Elysium podem desfrutar de robôs para servi-los a todo o momento, muitos moradores da Terra são expostos a incontáveis horas de trabalho em fábricas para produzirem mais robôs que serão enviados à estação espacial – como é o caso do protagonista Max (Matt Damon) que, após sair da prisão, vai trabalhar na produção robótica. Desde pequeno ele sempre teve o sonho de viver em Elysium e considera uma injustiça que apenas os ricos possam ter acesso ao lugar, deixando os pobres à margem da doença e miséria. Um dia, após ser exposto a quantidades fatais de radiação em seu trabalho e percebendo que por consequência disso lhe restariam poucos dias de vida, Max tentará a todo o custo chegar a Elysium, pois lá está sua única chance de se curar.

Para isso ele contará com a ajuda de um hacker revolucionário (Wagner Moura) para chegar ao seu destino, mas, em troca do favor, terá de invadir a mente de um ricaço que está na Terra e sabe as informações para entrar em Elysium. O que eles não contarão é com a intervenção de um psicótico mercenário (Sharlto Copley), que vive na Terra e trabalha para os comandantes da estação espacial, e inicialmente fará de tudo para impedir que o plano de Max dê certo.

Estreando no cinema hollywoodiano, o ator Wagner Moura demonstra estar bem à vontade em seu papel, tanto na atuação corporal, quanto na expressão vocal – o ator fala muito bem o inglês, apesar de não conferir em seus diálogos maior suavidade e continuidade rápida entre as palavras, típica da fala dos nativos, e conferindo um jeito mais brasileiro às suas conversas.  Porém este detalhe acaba sendo ofuscado pela tamanha desenvoltura interpretativa de Moura, que cresce gradativamente ao desenrolar do filme à medida que sua participação se torna maior.

A característica tão contundente de seu personagem permite que Moura possa exteriorizar e demonstrar com mais facilidade diante das câmeras seu talento interpretativo por meio corporal, fazendo com que ele não seja apenas um mero coadjuvante, mas ganhe destaque em grande parte da trama, inclusive desviando a atenção do público ao protagonista para si – não que Damon também não esteja excelente em seu papel, mas como se limita a encarar as atuações que o roteiro exige de seu personagem – até porque trata-se de um papel de expressões mais contidas e interiorizadas – a  atuação de Moura se torna mais visível.

A atriz brasileira Alice Braga, que já atuou em diversos outros filmes estrangeiros, também marca presença em Elysium como a amiga de Max que também pretende embarcar para a estação espacial a fim de curar sua filha, vítima de uma doença grave.

Outro destaque no quesito expressão cênica vai para o ator Sharlto Copley no papel do mercenário. Seus trejeitos e total vivacidade conferidos ao papel prendem a atenção do público, já que ele interpreta um dos principais antagonistas da trama que a todo o momento indica estar prestes a destruir o protagonista em conflitos cheios de ação e suspense.

Todavia, mesmo com tamanho elenco, o roteiro frustrará principalmente os telespectadores que forem assistir ao filme em busca de conteúdo histórico – algo que deixa a desejar, já que quase toda a trama é preenchida por efeitos visuais e sonoros e muitos combates, os quais acabam se tornando vazios diante da pobreza de conteúdo.

A produção tem direção de Neill Blomkamp, que se destacou no mercado cinematográfico depois de seu longa Distrito 9, indicado a 4 Oscar, incluindo as categorias Melhor Filme e Melhor Roteiro. Atores de diversas nacionalidades compõem o elenco da trama, sendo talvez até mesmo uma sacada do diretor para sua mensagem crítica à desigualdade social por meio do filme.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas



domingo, 1 de setembro de 2013

Tim Maia - Vale Tudo, o Musical


Aplaudido por mais de 320 mil pessoas no Rio e em São Paulo, o espetáculo Tim Maia – Vale Tudo, o Musical faz as últimas apresentações no Teatro Procópio Ferreira, na cidade paulistana. Baseado no livro de Nelson Motta, a trama narra alguns trechos marcantes da vida de Sebastião Rodrigues Maia, o famoso Tim Maia, um dos cantores e compositores de maior influência nacional, acompanhados de seus grandes sucessos musicais que repercutiram e continuam a repercutir entre gerações, mesmo após uma década e meia de seu falecimento.

Nesta temporada que retornou a São Paulo, o ator Danilo Moura é quem se destaca no papel do protagonista do espetáculo, que também já contou, em outras temporadas, com a participação de Tiago Abravanel – neto do apresentador Silvio Santos. Tiago se consagrou como Tim Maia e foi muito aclamado por público e crítica.

Mas Danilo Moura também se mostra incrível em corpo e voz ao atuar em cenas de memoráveis momentos vividos por Tim, como a entrada na adolescência, as inúmeras dificuldades encontradas para fazer sua carreira decolar, o surgimento da primeira banda, Os Sputniks, composta por ele e o rei Roberto Carlos, os encontros com Elis Regina, Jorge Ben e Erasmo Carlos e também seu intenso envolvimento com as drogas e o álcool que acabaram por destruir sua saúde e prejudicar gravemente a carreira artística. Devido a isso, ao final do musical, aqueles que viveram a época ou até mesmo passaram por tal situação também puderam relembrar o quanto que os fãs de Tim Maia dependiam da sorte quando este, ao final de sua carreira e vida, deixou de comparecer a inúmeros shows pelo péssimo estado de saúde em que se encontrava, com o organismo deteriorado pelos entorpecentes.

Sob uma abordagem narrativa, a musicalidade do espetáculo se revela apenas nos momentos em que são cantados os principais sucessos musicais do protagonista da história. E mesmo quem não é tão fã de carteirinha de Tim acaba se envolvendo com o convidativo clima cênico gerado no palco, além, é claro, do ritmo atraente contido nas músicas do cantor que viraram sucesso como “Vale Tudo”, “Chocolate”, “Azul da Cor do Mar”, “Gostava Tanto de Você”, “Você”, entre outros...

Logo de início, o primeiro número musical de Tim Maia – Vale Tudo, o Musical já cria forte empatia entre os espectadores nos primeiros minutos de peça, ao trazer o último show de Tim Maia – que não aconteceu devido ao infarto que ele sofreu no palco, resultando em sua morte. A cena se passa de forma tão vívida e enérgica que contraria a tendência convencional de alguns espetáculos de trabalharem gradativamente o crescimento cênico, o que acaba criando um envolvimento na plateia apenas com o decorrer da trama.

Graças ao excelente trabalho vocal do elenco, coreografias bem delineadas e uma boa dose de humor aplicada em quase todos os diálogos entre os personagens e também no estereótipo exagerado de muitos deles – além é claro da própria repercussão deixada por Tim, que por si só prende a atenção do público – que o espetáculo mantém o mesmo ritmo atraente do começo ao fim, com exceção de pequenas oscilações ocorridas no final, o qual se torna um pouco extensivo, em razão até mesmo da abordagem narrativa que contribui para prolongar o tempo da trama. No entanto, nada que não culmine para um grande final ovacionado pela plateia.

A desenvoltura corporal de Moura e, principalmente, a rouquidão de sua voz carregada e grave contribui para reviver a voz do grande artista que introduziu o estilo soul na música popular brasileira. Faltou apenas sua marca registrada, o característico bigode presente ao longo de sua vida, mas o ator soube trabalhar muito bem o jeito carismático e ao mesmo tempo exigente de Tim Maia, contribuindo para viver intensamente o personagem.

O ator Reiner Tenente também se destaca ao conferir jeitos e trejeitos na incorporação do ator Roberto Carlos e outros personagens, acompanhados de uma linguagem corporal que por si só leva a plateia a dar altas risadas, destaque este também marcante na atuação e impressionante voz de Pedro Lima, que interpreta, entre outros papéis, o pai de Tim Maia.


Dirigido por João Fonseca, Tim Maia – Vale Tudo, o Musical permanece em cartaz até 8 de setembro e certamente é um espetáculo emocionante não só para os fãs deste cantor, como até mesmo para quem não acompanhou muito sua carreira, mas acaba se encantando, dada a vivacidade trabalhada pelo musical do começo ao fim. 

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Minha Mãe é uma Peça


Quem já conhece e se diverte com a caricata personagem dona Hermínia no programa 220 volts do Multishow apresentado pelo ator Paulo Gustavo, certamente também se encantará com as cenas da personagem nos telões em Minha Mãe é Uma Peça. E mesmo quem não conhece a personagem acabará se familiarizando de certa forma com a comicidade das situações apresentadas, mesmo que algumas venham dotadas de exageros cênicos.

Assim como ele incorpora o papel em 220 volts – onde ele não só apresenta como encara todos os personagens do programa –, no filme o ator Paulo Gustavo interpreta a dona Hermínia – a mãe exagerada que vive em constantes brigas com a filha obesa Marcelina, a quem a mãe vive chamando de baleia e outros nomes depreciativos, e seu filho Juliano, que apesar do jeito afeminado tenta esconder de Hermínia sua homossexualidade – que vai passar um tempo na casa da tia após ouvir sem querer uma conversa entre seus filhos, seu ex-marido Carlos Alberto (Herson Capri) e Soraya (Ingrid Guimarães), mulher atual dele, e que a deixa muito magoada.

A partir de então Marcelina e Juliano ficam sozinhos em casa tentando se virar como podem, já que tanto um quanto o outro viveram sempre às custas da mãe, ao contrário do irmão primogênito deles que, segundo Hermínia, sempre foi um rapaz exemplar e vive com a esposa em Brasília.

Enquanto Marcelina passa quase todo o tempo da trama desesperada em busca de comida, seu irmão Juliano está mais preocupado em saber o paradeiro da mãe. Paralelamente a este cenário, dona Hermínia volta no tempo na casa de sua tia enquanto conta a ela diferenciadas e inusitadas situações vividas principalmente com seus herdeiros mais novos. A maioria das lembranças é acompanhada das atuações, que ilustram as histórias narradas pela protagonista fazendo a plateia cair na gargalhada, como nos tombos em que a pequena Marcelina sofria quando criança, a obsessão dela por comida, ou quando Juliano chega com um namoradinho em casa e passa por um verdadeiro interrogatório da mãe, que já desconfia da sexualidade do filho.

O roteiro praticamente gira em torno das atuações de dona Hermínia, de modo que os demais atores se tornam meros coadjuvantes diante não só de quase todo o espaço preenchido pela personagem, como da bela interpretação do ator Paulo Gustavo para o seu papel. Como a trama parece abrir espaços para uma atuação mais desenvolta e menos estruturada, possibilitando o encaixe de diálogos improvisados, Paulo Gustavo acaba se sobressaindo perfeitamente bem como já é de praxe no programa, pois tem um forte para o improviso.

Talvez seja por isto que a simplicidade da história e a falta da quebra de uma linearidade que pudesse surpreender o público acabam sendo ofuscados pelo personagem principal que chega a ser muito maior que até o próprio filme em si – se outro ator não habituado aos trejeitos do personagem o fizesse sob outro prisma, o filme já poderia estar fadado a um grande fiasco e só não o foi pela salvação de Paulo.

Este é um ator que vem se destacando cada vez mais na mídia humorística. Depois de arrebentar em seu programa cômico 220 volts, o humorista é certamente de longe o destaque de um seriado exibido há quase um mês no Multishow, Vai que Cola, e parece ter tudo para ascender ainda mais em sua carreira artística. Agora é torcer para que ele continue divertindo diferenciados públicos por meio de seu humor livre sem ser esquematizado em roteiros sólidos que o deixem preso – como a emissora Globo vem fazendo com astros do improviso como Marcelo Adnet e Fábio Porchat.


Minha Mãe é uma Peça tem direção de André Pellenz e foi para os telões depois de obter grande sucesso no palco teatral.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O Concurso


Com perfeita identidade de besteirol americano, o filme brasileiro O Concurso traz diversas piadas forçadas e personagens estereotipados passando por várias situações inusitadas que, a todo o momento, lembram os costumeiros roteiros humorísticos estadunidenses que arrancam risos do público através das cenas mais absurdas. É possível enxergar até mesmo certa similaridade com Se Beber Não Case, ressaltando a diferença que esta produção soube trabalhar e conduzir o roteiro com mais detalhes, um humor que divertia o público e criava expectativas com histórias exageradas, mas ao mesmo tempo bem elaboradas.

Já em O Concurso, à medida que se transcorrem os 86 minutos de filme, este caminha cada vez mais para o fiasco. A trama conta a história de quatro candidatos que foram selecionados para fazer uma prova referente à ultima etapa do processo de seleção para uma vaga de juiz federal no Rio de Janeiro. São eles: um humilde cearense (Anderson Di Rizzi) que vive com sua esposa (Carol Castro) que está grávida, um gaúcho (Fábio Porchat) que esconde sua homossexualidade e tem um pai (Jackson Antunes), extremamente rígido, que exige do filho a conquista da vaga de juiz, um rapaz (Rodrigo Pandolfo) extremamente tímido do interior de São Paulo e um advogado (Danton Mello) oportunista que consegue se safar de várias situações sempre com seu famoso “jeitinho”.

Esses quatro embarcam para o Rio de Janeiro a fim de realizar a última prova que dará o título de juiz a um deles e passam por distintas situações antes do teste. A abertura da trama mostra os candidatos deitados de forma completamente inusitada em uma rocha, indicando que os rapazes tiveram uma noite “daquelas”. Em seguida, o filme volta no tempo, mostrando a partida de cada um para o Rio e como eles chegaram àquela situação.

O que parecia uma história com uma trajetória cheia de obstáculos e expectativas criadas ao redor dos personagens antes que eles pudessem fazer a temida prova, acaba culminando num roteiro estático e dotado de pouquíssimas cenas surpreendentes ou realmente cômicas.
Nem a desenvoltura dos quatro atores que tentavam crescer dentro dos seus respectivos personagens com seus dotes cômicos, que vez ou outra arrancavam algumas risadas da plateia, foi páreo para a pobreza do roteiro.   

O ator Fábio Porchat, que depois de deslanchar seu talento entre milhares de internautas por meio dos diversos vídeos humorísticos exibidos no canal do Youtube chamado “Porta dos Fundos” e ainda ser chamado para atuar no programa “A Grande Família”, além de marcar presença em vários comerciais, certamente foi uma das principais apostas desta produção para fazer jus ao seu gênero comédia e divertir o público.

É certo que, dada a caracterização do seu personagem, o ator está bem, interpretando um gaúcho que tenta conter seu jeito afeminado para não revelar sua homossexualidade, no entanto ele fica muito aquém de sua capacidade artística por se prender a um roteiro que está abaixo de seu talento.

O Brasil vem se destacando por um leque de humoristas como Marcelo Adnet, Fábio Porchat, Ingrid Guimarães e Paulo Gustavo, os quais simplesmente arrebentam quando estão em situações cômicas, das quais eles mesmos têm o total domínio da cena. Mas, querendo abocanhar todas as grandes estrelas para si, a Rede Globo acabou por roteirizar e, assim, prejudicar a espontaneidade cômica de alguns artistas, como foi o caso de Adnet, que teve de seguir o fraquíssimo roteiro de O Dentista Mascarado, cuja baixa audiência foi responsável pelo pouquíssimo tempo de duração da série.

Enfim, o mercado artístico brasileiro está repleto de grandes estrelas que sabem entreter e conquistar a admiração do público, mas, principalmente no que tange ao aspecto cinematográfico, é necessário investir em roteiros mais trabalhados que estejam compatíveis com o ritmo e o talento dos atores.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas


domingo, 4 de agosto de 2013

A Obscena Senhora D


Quem nunca se questionou, seja para si ou para os demais, sobre as grandes perguntas que intrigam a humanidade a respeito do inexplicável milagre da vida e toda sua evolução e complexidade? Essa reflexão é um dos temas principais a ser explorados no monólogo dramático A Obscena Senhora D.

A atriz Suzan Damasceno vive a personagem Hillé, uma viúva de 60 anos que sente muita falta de seu marido e passa grande parte de seus dias relembrando os diversos momentos vividos com ele, principalmente os mais íntimos. Há anos Hillé vive debaixo do vão da escada de sua própria casa, onde ela se enclausurou e decidiu não sair mais. A perda do esposo apenas contribuiu para que ela transitasse ainda mais entre o sano e insano sendo tachada de louca por toda a vizinhança.

Durante os 60 minutos de espetáculo, a personagem permanece quase o tempo todo sentada em uma cadeira, revelando para o público alguns fatos de sua vida e, principalmente, as angústias que tanto a assolam e a fizeram se isolar dos demais. Ela tem conversas frequentes com um imaginário menino porco, um meio encontrado por ela de questionar a Deus todas as suas dúvidas.

E foi justamente a imensidão de incógnitas recheando o cérebro de Hillé que a fez se afastar até mesmo de atividades rotineiras, já que ela queria e não conseguia obter a compreensão de tudo, pois dizia apenas saber da existência do divino sem entender sua ação sobre cada coisa na Terra.

A intelectualidade presente no diálogo com o público se dá de forma cativante. A peça propõe aos espectadores não apenas analisarem os conflitos psicológicos de Hillé como meros observadores, mas também entrar dentro da complexa e atormentada mente da protagonista e ‘sentir na pele’ todas as suas aflições.

Toda a genialidade do roteiro se exalta ainda mais diante da intensa e brilhante atuação da atriz Suzan, que confere total entonação e vivacidade em cada palavra pronunciada por ela, apenas despertando no público a vontade de se envolver cada vez mais com o calor e a emoção provocados pelo texto.

O simples cenário vira apenas um mero complemento no palco, já que a atriz consegue incorporar toda a complexidade do roteiro. Vale ainda destacar os diversos momentos em que ela narra conversas entre Hillé e seu marido, ou os vizinhos, transitando entre passado e futuro. Em todos estes diálogos, diante de sua ótima transformação vocal e cênica, ela delineia tempo e personagens de uma forma tão clara e precisa, criando um perfeito cenário imaginário, que permite a total compreensão da imersão na trama pela plateia.

Autointitulada de A Senhora D, Sem Deus, ela leva a quarta letra do alfabeto em seu nome por se referir a si mesma como a imagem viva da Derrelição, ou seja, do desamparo, do abandono e do isolamento total ao qual ela mesma se entregou por completo na tentativa desesperada de tentar entender o incompreensível, afastando-se dos demais. Já o termo obsceno é para se referir à forma como ela encara a própria existência, dizendo ser a vida uma aventura obscena, de tão lúcida.
 
Sua preferência pela cor parda, sem vida, também se destaca na composição e iluminação do cenário e até mesmo nos papéis em formato de peixes que ela recorta e deixa dentro do aquário para substituir os animais que morreram.


A Obscena Senhora D é baseada no texto da escritora brasileira Hilda Hilst e tem direção de Donizeti Mazonas e Rosi Campos. 

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

domingo, 28 de julho de 2013

Rock In Rio - O Musical


Baseado num dos maiores festivais de música realizados no Brasil, o musical Rock in Rio – O Musical conta um pouco da história do evento e do contexto político em que estava inserido, mas se atém principalmente a mostrar as músicas dos grandes cantores brasileiros e internacionais que fizeram sucesso e continuam a ter grande repercussão entre as diversas gerações, sendo idolatradas por todas elas.

A trama se foca na história fictícia de Aleph, um jovem rapaz que decide ficar mudo após a morte de seu pai e só se conecta com o mundo através da música, para desespero de sua mãe (Lucinha Lins), que já enfrentou 15 anos sem ouvir uma sílaba do filho e quer convencê-lo a falar a todo o custo.  Além disso, Aleph (Hugo Bonemer) é extremamente tímido e passa a maior parte do tempo conectado ao mundo musical através de seus fones de ouvido.

A situação começa a mudar um pouco para o rapaz quando ele conhece Sofia (Yasmin Gomlevsky), filha de um empresário musical (Cláudio Lins) que irá produzir a primeira versão do Rock in Rio no Brasil, e seu encantamento pela garota faz com que ele perca um pouco da timidez e consiga até mesmo expressar algumas palavras e cantar em voz alta. Enquanto a garota ajuda o protagonista a se tornar alguém mais comunicativo, este, por sua vez, desperta na nova amiga um amor pela música, já que Sofia só gostava de falar e mal podia ouvir alguém cantando desde o desaparecimento de sua mãe, que ela acreditava ser culpa da música.

Na abertura do espetáculo podemos ver as representações de diversos ícones musicais, como Rita Lee, Cazuza, Ozzy Osbourne, Axl Rose, Freddie Mercury, Stevie Wonder e Britney Spears, entre outros, cantando a música tema do festival. A cena de abertura cria uma empatia na plateia logo de início, permitindo que ela se envolva totalmente com esta superprodução rapidamente – afinal, quando a peça usa de recursos cênicos extremamente atraentes para os espectadores se conectarem a ela logo de início, o espetáculo tem tudo para crescer em cena em conjunto com a plateia.

E assim acontece neste musical, cuja empatia criada no começo cresce gradativamente com o desenrolar da trama. Tanto em termos de cenografia quanto coreografia, Rock In Rio – O Musical é extremamente detalhista e retrata muito bem toda a mistura de estilos musicais, que foi ganhando força num festival que, a princípio, focava nos astros do rock.

Um dos momentos mais deslumbrantes da peça ocorre justamente na reprodução desta mescla de estilos, ao fazer um compacto por diversos sucessos nacionais e internacionais incluindo rock, pop, axé, forró, entre outros de modo intenso e instantâneo, ao mesmo tempo criando uma imensa vontade de dançar e cantar junto com o elenco. Pincela a apresentação também alguns costumes, como a moda vigente e alguns jargões de época.

Apesar de ter uma identidade completamente jovial, o espetáculo conquista todas as gerações por trazer os diversos sucessos musicais que transitaram entre 1985 (quando ocorreu a primeira edição do Rock In Rio) e hoje, como “Pro Dia Nascer Feliz”, “Freedom”, “Tempo Perdido”, “Será”, “Ovelha Negra”, “Pessoa Nefasta” e “Fear of the Dark” despertando, certamente, boas lembranças em quem já passou pelos tempos dos primeiros festivais e, principalmente, participou deles, e também chamando os mais jovens para curtir sucessos que encantaram e encantam a todos, face à sua inefável musicalidade.

Todas as canções são entoadas de modo tão profundo, acompanhadas de brilhantes interpretações e coreografias crescendo grandiosamente a cada nova troca cenográfica, que chegam até mesmo a ser maiores do que a própria história da trama em si, cuja simplicidade se ofusca por trás da reprodução do festival que, por si só, toma conta da cena.

O ator Hugo Bonemer, que faz o protagonista da trama, por exemplo, está muito bem em seu papel do rapaz tímido, mas passa por uma explosão cênica instantânea em todos os momentos em que canta, tamanha a intensidade interpretativa que ele confere para cada estrofe, cantado e levando a plateia para o cenário descrito na letra da música. A atriz Yasmin Gomlevsky também se destaca pelo seu vozeirão na entonação das canções.

Outros atores como Lucinha Lins, Ícaro Silva (que se destaca no papel de amigo de Alef) e Luiz Pacini (que faz o dono de uma loja de discos) também demonstram seu talento musical como cantores solo.

Com direção de Delia Fischer e João Fonseca, o musical ainda usa de ótimos recursos para, por exemplo, promover um diálogo apenas com as letras de músicas já conhecidas. Rock In Rio tem três horas de duração que passam quase despercebidas pela plateia, tamanho o envolvimento criado por toda a superprodução.

Este é mais um musical totalmente brasileiro que faz sucesso no país. Diante do repertório de produções da Broadway que ganham versão nacional, o crescimento do número de musicais criados aqui como Tim Maia – Vale Tudo, o musical e Milton Nascimento – Nada Será como Antes, só reforça a capacidade do país em também elaborar espetáculos baseados em grandes tesouros nacionais, em especial aqueles baseados na nossa própria cultura.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

terça-feira, 16 de julho de 2013

O Rei Leão


Título de maior bilheteria da Broadway, recebido em 2012, com arrecadação de U$ 835,8 milhões desde sua primeira apresentação no local, ocorrida em 13 de novembro de 1997 e que ficou conhecido como O Rei Leão: O Marco da Broadway, e um dos musicais de maior sucesso na história do teatro, chega ao Brasil no Teatro Renault (antigo Teatro Abril), localizado em São Paulo.

A trama, baseada num dos mais famosos filmes produzidos nos estúdios da Disney, que encantou gerações e continua a encantar até hoje, traz a história do simpático leãozinho Simba (o papel revezado em cada apresentação pelos atores mirins Gustavo Bonfim, Henrique Filgueiras, Matheus Braga e Yudchi Taniguti) – filho do Rei da Selva: o Leão Mufasa (papel de César Mello) – passando por uma série de aventuras e perigos logo após a morte do seu pai, pois o filhote é orientado pelo malvado tio Scar (Osvaldo Mil) a fugir, o que faz seu sobrinho acreditar ser o culpado pela morte do pai, quando na verdade o tio é o responsável pela tragédia, visando assumir o posto do irmão e todo seu poder.

Após fugir, Simba encontra os simpáticos e divertidos Timão (Ronaldo Reis) e Pumba (Marcelo Klabin), um suricato e um javali, que vão acompanhá-lo enquanto o pequeno cresce e entra na fase da puberdade (e passa a ser interpretado pelo ator Tiago Barbosa). Nesse período, ele também reencontra Nala (Josi Lopes), uma amiga de infância, quando um clima de romance pinta no ar.

Quem já viu e reviu o filme, seja nos telões ou nas telinhas, certamente perceberá que ele foi totalmente reproduzido no palco quase sem alterações, com o destaque que a animação da Disney praticamente ganha vida ao ser transformada em uma superprodução que faz total jus a esse título, vislumbrando o olhar da plateia do Teatro Renault.

Logo de início, a emocionante abertura composta pela passagem de diversos animais para assistirem ao nascimento do filho do Rei Leão já arranca suspiros emocionantes dos espectadores, pois o musical não se contenta em restringir um espetáculo de luzes, malabares, figurinos e cenários impecáveis aos limites do palco. Aplicando uma técnica circense, a entrada é marcada pela passagem destes personagens pelos corredores do teatro, interagindo, encantando e divertindo o público.

Passam pelas escadas da plateia atores fantasiados, que se movimentam com os braços e pernas apoiados em pernas de pau formando imensas girafas de pano, outra parte do elenco se junta para compor um elefante, cujo tamanho e formato é semelhante ao animal verdadeiro, entre muitos outros habitantes da floresta que, não apenas no início, como em vários outros momentos, interagem com os espectadores, deixando o espetáculo muito mais lúdico e dinâmico.

Há que se destacar também a atuação e desenvoltura dos três atores (Juliana Peppi, Jorge Neto e Felippe Moraes) que interpretam as famosas hienas, seguidoras do Leão Scar que, a pedido dele, o ajudam a preparar a armadilha que culminará na morte de Mufasa.  Momentos memoráveis do longa-metragem da Disney, como a aparição de Timão e Pumba cantando “Hatuna Matata” são reproduzidos impecavelmente no palco arrancando aplausos do plateia, contribuindo demasiadamente para despertar imensa empatia na público, pois quem não se encanta com estes engraçadíssimos personagens e a brilhante atuação e incorporação dos atores Ronaldo Reis e Marcelo Klabin, que interpretam o suricato e o javali?

Em termos de atuação, o destaque vai para o ator Cesar Mello, que interpreta o Mufasa. Mello consegue passar todas as características do seu personagem de forma clara e cativante, pois o ator está tão envolto em seu papel que, mesmo se estivesse desprovido de figurino, conseguiria fazer com que a plateia acreditasse no Rei Leão, que muitas vezes rouba toda a atenção do público para si no palco.  Já no quesito voz, o destaque vai para a atriz sul-africana Phindile Mikhize (que inclusive já cantou ao lado de Michael Jackson), que faz o papel da babuína Rafiki, e tem uma das vozes mais brilhantes do espetáculo emocionando o público ao entoar as canções.

Em termos de produção não há o que discordar: a mistura de efeitos cênicos e circenses por meio de malabares, simulação de pássaros que voam, cenários que se alternam instantaneamente e surgem de modo completamente distinto do anterior e repleto de objetos que parecem surgir magicamente levam a plateia para o exotismo selvagem africano, cenário da história. O próprio musical poupa a imaginação do público, pois o perfeccionismo na reprodução da selva, com a ajuda do excepcional trabalho de expressão corporal do elenco, é quase tão concreto que não há muito que imaginar diante de tamanho espetáculo, pois a realidade da trama parece acontecer ali no palco.

Não há como ficar indiferente, por exemplo, a uma das cenas mais deslumbrantes do musical, quando Simba vê a imagem de seu pai refletida na água e surge então repentinamente, ao fundo do palco, fragmentos que formam o rosto de Mufasa num tamanho gigantesco que chega a emocionar quem assiste. 

O sincronismo nas coreografias de dança, tão famoso por ocorrer de modo impecável nas produções norte-americanas, ganha cada vez mais fôlego nos palcos brasileiros como, por exemplo, nos números apresentados nesta peça e que acontecem em total sintonia.

O Rei Leão tem canções de Elton John e Tim Rice e tradução e autoria para a versão nacional de Gilberto Gil. A direção é de Julie Taymor.  

Por Mariana da Cruz Mascarenhas



quarta-feira, 26 de junho de 2013

Dama da Noite


Escrita por Caio Fernando de Abreu (1948 – 1996) – um dos grandes escritores e dramaturgos brasileiros, famoso por retratar a sociedade sob um prisma dramático, sempre abordando temas como morte, sexo e solidão – a peça Dama da Noite é um monólogo que traz a história de uma mulher da noite que resolve trocar a vida noturna pelo dia e sofre arduamente por se sentir excluída do mundo em que vive.

O ator Luiz Fernando Almeida é quem se destaca no papel da protagonista, encarando uma personagem cercada de angústias e aflições por enxergar tudo ao seu redor como uma grande roda gigante, composta por seres humanos obstinados a viverem uma rotina pacata e totalmente privada de liberdade, se valendo de falsidade, moralismos e estereótipos discriminatórios, para se equilibrarem na roda e conquistarem uma alta posição.

Realizado no Espaço Cultural Pinho de Riga, o espetáculo acontece em um ambiente composto por poucos lugares, o que facilita para a concretização de um dos propósitos da peça que é proporcionar total interação com cada integrante do público. Durante os 50 minutos de apresentação, a personagem retrata suas angústias e visões realísticas e pesadas da sociedade em um cenário que indica ser sua casa, mas também pode ser qualquer outro lugar na imaginação da plateia. A proximidade do ator com o público permite que ele converse e interaja com vários expectadores durante todo o tempo de espetáculo.

Por se tratar de um roteiro baseado numa dramaticidade intensa e polêmica, o ator faz questão de transmitir todo esse clima pesado para os momentos de conversa e interação com alguns integrantes da plateia de modo bem invasivo, até mesmo para não quebrar a linearidade dramática trazida pelo espetáculo.

Luiz Fernando está espetacular na incorporação de seu personagem que se dá, logo de início, de maneira grandiosa e envolvente chegando a transmitir para a plateia os sentimentos melancólicos vividos pela protagonista. Com cenário simples, quase desprovido de efeitos, é o ator quem conquista os expectadores ao conseguir, por si só, transmitir geniosamente tudo o que Caio Fernando de Abreu quis repassar ao escrever esta peça.


Portanto, vale conferir esta obra de Abreu encenada no palco do Espaço Cultural Pinho de Riga. Com direção de André Leahun, Dama da Noite é uma peça para se assistir desprovido/a de qualquer preconceito e com uma mente totalmente aberta diante das interações e exposições que a plateia se sujeita a estar.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas