Mesmo
com contexto e filmagens enriquecedores, Argo não foi melhor que outros
indicados
Com danças, cantorias e
piadas sem graça de sempre (que insistem em marcar presença nas cerimônias do
Oscar), a maior festa da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas deste
ano não teve muitas surpresas, mas, diferentemente das ocasiões anteriores, uma
premiação bem dividida entre os filmes indicados, dada a excelência de alguns que
contribuiu para uma disputa bastante acirrada.
Um dos momentos surpreendentes
talvez tenha ocorrido no desfecho da cerimônia quando ninguém menos do que a
primeira-dama norte-americana Michelle Obama anunciou, direto da Casa Branca, o
vencedor do Oscar de Melhor Filme 2013: Argo,
produção que já vinha sendo cotada para vencer a categoria, levando-se em
conta o histórico de premiações já conquistadas pela trama em 2013, as quais
incluem Globo de Ouro por Melhor Filme e Direção (Ben Affleck) e o prêmio de
Melhor Elenco pelo Sindicato dos Atores. A produção ainda levou as estatuetas, com
toda a justiça, de Melhor Montagem e Roteiro Adaptado.
Mais até do que um meio
de indução da indústria cinematográfica para a venda de seus produtos em todo o
planeta, a escolha de Argo e sua
divulgação pela Senhora Obama deve provocar no meio cinematográfico uma reflexão
sobre a politização - ou o uso político - da premiação, não apenas como recurso
para minorar a imagem tirânica dos EUA disseminada no Oriente Médio, principalmente
em países como o Irã, Paquistão ou Iraque, como recurso para aumentar a
popularidade governamental no âmbito interno.
Apesar dessa pretensa
jogada, e da intensa repercussão nos países islâmicos, há que se ressaltar a
forma agressiva como essa divulgação foi recebida por lá: só para citar um
exemplo, a agência internacional islâmica FAR editou as imagens acrescentando
mangas e tecido ao decote generoso da primeira dama norte-americana.
E por falar em
supervalorização norte-americana, o filme líder em indicações (12), Lincoln, de Steven Spielberg, ganhou
apenas duas estatuetas por Melhor Direção de Arte e Melhor Ator para Daniel Day-Lewis.
Esta última premiação foi mais do que justa e não tinha como ser diferente, já
que o ator foi espetacular na incorporação de Lincoln, um personagem tão
grandioso e, ao mesmo tempo tão sutil, e que era pressionado pelo próprio cargo
a interiorizar suas emoções.
Mas as láureas para
Spielberg pararam por aí, já que, mesmo com todo seu esplêndido trabalho de
direção, que parecia transportar a plateia do cinema para o contexto histórico
onde se passa a trama, o prêmio de Melhor Direção foi para Ang Lee, diretor de As Aventuras de Pi, que a meu ver teve
um excelente trabalho artístico, mas sua direção em geral não pode ser definida
como a melhor entre os indicados. A produção de Lee ainda levou o Oscar de
Melhor Trilha Sonora, Efeitos Visuais e Fotografia. As duas últimas premiações
foram sim devidamente merecidas, em virtude do espetáculo de cores e luzes
proporcionado aos olhos da plateia.
E, mesmo com a injustiça cometida com o diretor
Quentin Tarantino, mestre dos longas de violência moderna, que ficou de fora da
disputa à categoria de Melhor Direção – assim como Ben Affleck (Argo) e Kathryn Bigelow (A Hora Mais Escura), também
surpreendentemente excluídos da indicação – ele ainda levou a estatueta de
Melhor Roteiro Original, com seu filme Django
Livre. Nesta mesma produção, há que se destacar o Oscar de Melhor Ator
Coadjuvante para o grandessíssimo Christoph Waltz, mais do que justo, dada sua
fantástica interpretação como um sarcástico caçador de recompensas, cujo efeito
foi capturar a atenção de praticamente toda a primeira parte da história para
si.
Já o tão falado longa Os Miseráveis, que trouxe para os telões
a magnífica obra de Victor Hugo na forma de um grandioso musical, ganhou três devidas
estatuetas: Melhor Maquiagem, Mixagem de Som – o diretor Tom Hooper fez um
trabalho de som e acertou em cheio ao
optar pela gravação das canções ao vivo – e Melhor Atriz Coadjuvante para Anne
Hathaway, que estava totalmente imersa em seu papel do começo ao fim da trama,
emocionando e envolvendo a plateia.
A
Hora Mais Escura, que soube narrar nas devidas proporções
como o terrorista Osama Bin Laden foi capturado e morto, levou apenas um Oscar
de Melhor Edição de Som junto com o filme 007
– Operação Skyfall em um empate, algo raro de se acontecer nestas
cerimônias.
E o prêmio de Melhor
Atriz ficou para Jennifer Lawrence, atriz de O Lado Bom da Vida, filme que, apesar do bom contexto, tem um
desenrolar simples e desprovido de surpresas, o que não justifica suas
indicações - inclusive para Jennifer, que fez uma boa atuação, mas manteve a
linearidade sem investir em muitas emoções. A surpresa deve ter sido tamanha
que a própria atriz levou um tombo na escada de acesso ao palco, bem na hora de
receber a estatueta.
Concluindo, com algumas
indicações esperadas e outras não, para mim, a surpresa maior foi assistir a
vitória de Argo na categoria Melhor
Filme. Contando a história de como seis diplomatas norte-americanos conseguiram
escapar do Irã, depois de serem ameaçados pela população local, a produção conduz
bem a história, com apropriados planos de filmagem que criam suspense na
plateia, mas nada tão espetacular que outros longas como Os Miseráveis e Lincoln
não superem.
Por Mariana da Cruz Mascarenhas